Sunday, January 11, 2009

Desapego, ma non troppo ou O maior post do mundo


Depois de três excelentes dias de "férias" em São Paulo, voltei pra Minas na manhã de ontem, pra participar da missa de sétimo dia da minha Tia Lucy.

Como com tudo nessa vida a gente aprende alguma coisa, dessa vez não seria diferente.

A minha Tia Lucy sempre foi pra todos nós, meio coadjuvante, em relação à grande estrela Vó Jalé. Meu Vô Pipe morreu antes de eu nascer, meu tio Silvio já era casado e minha mãe também, então Tia Lucy e Vó Jalé viraram uma só, há coisa de quarenta anos.

Meu Tio Silvio morreu de um câncer de pele com metástase no cérebro que o levou embora em menos de três meses. Isso foi há doze anos.

Tia Lucy e Vó Jalé seguraram uma à outra, mais unidas do que nunca.

Vó Jalé, depois de 98 anos muitíssimo bem vividos - eu disse MUITÍSSIMO bem vividos - se foi também, há um ano e meio, deixando um vazio tão grande, tão grande, tão grande e uma saudade que eu acho que nunca vai passar.

A Tia Lucy ficou lá, coadjuvante de mais nada, levando a vida dela sozinha. Pregando aos quatro cantos que estava bem, que não queria morar com uma nem com outro, que se cuidava.

Não. Não se cuidava.
Não. Não estava bem.

Eu aprendi que os vazios, as dores, a saudade, são coisas que levam tempo pra cicatrizar, e que sozinho, leva mais tempo ainda. Dói mais.

Eu tenho muito certo pra mim que eu gosto de ser independente e de viver sozinha, mas que eu não quero isso pra sempre.
Eu aprendi também que quando eu sentir que uma pessoa está triste, e principalmente se ela tiver um motivo forte para isso, mesmo se ela disser "eu estou bem", é bom eu ficar com ela, fazendo companhia, jogando conversa fora, chorando junto se for o caso.
E eu aprendi que quando eu estiver triste por qualquer coisa e alguém me perguntar se eu estou bem, eu vou dizer a verdade. Vou sim.
Porque eu tenho mania de estar bem.
Mas às vezes isso pesa e eu não fico tão bem assim, mas aí eu digo que estou estranha e vai passar. E choro no escuro sozinha. E muito.

A minha mãe tinha um pai, uma mãe, um irmão e uma irmã.
Agora é só ela. Tem a gente aqui, mas da família mater, agora tem ela.

Eu aprendi que eu tenho que valorizar muito mais a minha mãe, o meu pai, as minhas três irmãs e meu irmão, meus cunhados, cunhada, sobrinhos e maridos e namorados de sobrinhos, e a Let, minha irmã adotiva que a gente já não vive sem.
Agradar, abraçar, beijar, ligar, comprar um presente à toa, mandar e-mail, mandar mensagem, ligar, torcer por, vibrar com, chorar com, dar muita risada com.
Porque é só isso que a gente pode fazer, porque um dia todo mundo vai embora, que benção se fosse todo mundo junto e sem sentir dor.

A minha irmã Marília, a mais velha, já nasceu cuidando dos outros. É dela isso.
E ela cuida de TODOS os outros. Se você que está lendo isso, precisar que cuidem de você por qualquer razão, ela cuida.
Ela toma frente, ela vai buscar, ela marca médico, ela paga, ela interna, ela briga, ela dá notícia, ela entra na UTI, ela comemora cada melhora.

Eu não.
Mas eu sei que eu sirvo pra um monte de outras coisas e que eu faço o que eu posso.

Eu aprendi aqui comigo e com esse tanto de irmãs envolvidas nessa história, que cada um tem um limite, um jeito de fazer as coisas, um jeito de ajudar.
Que ninguém... mas NINGUÉM é inútil nessa vida, e que a gente tem que respeitar o nosso limite, tentar ir um pouquinho mais se sentir que dá, recuar se não der, e agradecer. Agradecer por quem consegue ajudar mais. Pedir pra Deus abençoar muito essas pessoas e botar pessoas assim no caminho delas pra o caso delas precisarem de ajuda um dia. E essas pessoas podem ser a gente mesmo, tentando ir além do nosso limite. Precisando de verdade, tenho certeza que a gente consegue.

A minha família é assim. Gruda um no outro quando a coisa aperta. Sempre foi assim. A gente é tudo meio solto, mas quando a gente precisa uns dos outros, Deus do céu, como a gente se ajuda.
Aos olhos de quem vê de fora, pode parecer até estranho.
Muito drama, muito sofrimento por uma tia até então, coadjuvante.
Mas a gente é assim, uai.

E acho que é tão genuíno que os amigos se envolvem e entendem.
Eu confirmei uma coisa que eu sempre soube.
Eu tenho amigos.
Tenho sim.
Em Minas, em São Paulo, na Bahia, em Santa Catarina.
Na Espanha e nos Estados Unidos.
Como me enterneceu receber cada telefonema, cada e-mail, cada mensagem!!!

Ontem eu voltei à casa da Vó Jalé e Tia Lucy.
Eu, minha mãe, e duas das minhas três irmãs.
Muito difícil. Entrar na casa vazia, sem elas, sem a mesa da copa que deu espaço ao caixão no domingo passado.
Mexer nas caixas cheias de papéis e fotos em busca de documentos pra cuidar de inventário.
Lidar com a história de nós todos ali, naquelas caixas.
Você não imagina o que tinha naquelas caixas!!!
Lembrancinhas da primeira comunhão de TODOS os sobrinhos.
Convite de formatura das minhas irmãs da faculdade.
Convite da minha formatura do Jardim da Infância e do Pré-Primário.
Foto minha sentada na escada do quintal da minha casa com a Tia Lucy de pernas cruzadas. Eu com uns três anos, imitando ela que nem tava me vendo sentada uns degraus acima.
Cartão da minha mãe e do meu pai, da viagem deles de lua de mel.
Coisa que a gente não sabia que existia. Tudo ali, guardado.

Aprendi que devo me desapegar de tudo, menos das boas lembranças que qualquer pessoa que marque minha vida possa me trazer.

Vi que de um dia pro outro a gente vai embora porque não tava bem, e deixa isso tudo aí, pra trás, e que as lembranças, as fotos, os cartões, as cartinhas com letra de criança no papel amarelado, a HISTÓRIA, é o que fica. É o que emociona. É o que aquieta o coração.

Pegamos a estrada de noite, as quatro mulheres tão fortes, cada uma lembrando mais histórias e falas daquelas outras duas mulheres tão fortes que fizeram a nossa história de mulheres fortes, iluminadas por uma lua tão grande, tão linda, tão clara que só podia ser coisa delas olhando a gente lá de cima.

Aprendi que o que eu sou, e quem eu vou me tornar, vai depender tão somente das pessoas que passarem por mim, iluminando, aprendendo comigo e me ensinando.

E aprendi que nessa vida, não tem coadjuvante. A Tia Lucy nunca foi coadjuvante, sempre foi tão estrela quanto a Vó, até porque, elas eram praticamente uma.

Cada um de nós, é uma estrela brilhante, iluminada por uma lua como aquela que nos guiou ontem à noite pela estrada afora.

15 comments:

Anonymous said...

Olha... não dou conta de falar nada agora não...
Acho que ainda vai demorar uns dias pra conseguir pensar com a razão, digerir tantas coisas tão fortes e significativas acontecendo em tão pouco tempo nas nossas e na minha vida.
Talvez escrever seja uma boa estratégia, mas eu ainda tô na fase fuga, achando ótimo estar trabalhando, e ter bastante coisa pra fazer.
É bom ler o que vc escreve, dando nomes e caras pras emoções da gente.
Te gosto demais, caçula!

Anonymous said...

Depois de ler o que vc escreveu e o que sua irmã postou fico totalmente sem ter o que dizer....

Anonymous said...

Chorei... Não guentei.
Adoro vc.

Dra. Tormenta said...

Lora da minha vida!!!
Como você me tocou com esse seu post...
Num paro de chorar aqui não...

Lindo demais demais demais...

Linda você, com cabelo novo e tudo mais.

Que bom que você está na minha vida!

Beijo para você e para sua família toda tão querida!

Amo você um tantão...

Anonymous said...

Pat, cada dia que passa você escreve melhor, impressionante isso! Eu fiquei emocionada, mesmo!

Beijos orgulhosos

Bonoras no Canadá said...

Meu deus! Eu to aqui tentando não chorar, pq foi lindo demais Pat!
Nem sei mais o que comentar...

Anonymous said...

Pat!!!
Nossa! Lindo mesmo o que vc escreveu! Valeu apena ter lido, a gente nem sente que tá grande!
Tô com saudade de vc!!!
Beijão!

Anonymous said...

Como não chorar?
Como não ser feliz de saber que posso te chamar de amiga!

Um BEIJO enorme.....te adoro!!!!

Patricia

Anonymous said...

Talvez passe despercebido para muitos, para todos, mas é bonito ver o que estas mulheres todas - só mulheres, olha - andam aprontando. Da vovó, nem é preciso dizer; da tia, se disséssemos ninguém haveria de dar tenência; da mãe e das irmãs, melhor não dizer, já que tudo que pudesse ser dito seria insuficiente para fazer caber. Só fica um pouco a pecha de os homens, cada um por seu modo, muitas vezes ficarem parecendo as mulherzinhas da casa.

Anonymous said...

É....não tem mais oq dizer!!!
Pat, arrasou....
E é isso q vocês são...mulheres muito fortes...e q dão a base e servem de exemplo pra gente...q tá començando agora!!!

AMO muito vocês!!! E tô morrendo de orgulho da MINHA madrinha!!!!

Beijos!!

Fernanda MBem said...

Nêga do céu...
Como te falei na ligação que nem esperou terminar de ler o post lindo, chorei, chorei, chorei.

Tive que te ligar para saber como você estava depois de tanta coisa acontecendo com vocês aí ao mesmo tempo.
E percebí que não mudou nada, que você tem sim essa habilidade de viver em meio às estrelas e à lua e aprender e esinar muito sim.

Todo dia,
em SP, MG, SC... USA, escolha a sigla e o coração.

Tá aqui já.

Lindo.
Amei.

Raquel said...

O maior comentário do mundo:

Nossa, Pat...
Eu juro que escrevi, também. Em inglês, ainda... pra quase ninguém mais ler. Mas agora, depois de ler isso aqui, nem sei se vou postar. O q eu escrevi ficou tão insignificante perto de tudo q vc disse. E assim, de longe, é tão difícil sentir o q vcs estão sentindo.
Olha, quando a Tia Silvia foi lá em baixo pra falar com a minha mãe, eu fingi q estava dormindo, porq eu não podia acreditar, e não queria aceitar. Queria dormir de novo e acordar e descobrir q tinha sido só um sonho... mas não foi.
Eu dormi e acordei e dormi de novo e acordei... e fiquei lá em baixo, porq eu sabia q se subisse eu não aguentaria mais fingir ser forte.
Mas aí vc me chamou... e eu não aguentei mais, mesmo. Depois de ver você, a vó, a Tia Silvia, minha mãe... eu não aguentei. Principalmente depois de ver vc...
Só aguentei até pouco antes de vcs irem embora, porq eu tinha q aguentar. Aí eu chorei... chorei, porq tive vontade de arrancar tudo o q vcs estavam sentindo e enfiar dentro de mim, pra sentir sozinha e pra vcs poderem ser felizes e pra poderem esquecer aquilo tudo e não terem q fazer mais nada.
Mas eu não podia, e isso ainda me dói muito...
Não sei mais o q dizer. Aprendi um cado com tudo isso tbém... mas o q aprendi mais foi o medo q eu tenho de perder vocês.
Amo vc demais.

Anonymous said...

Sabe, fiquei aqui pensando em tudo isso que vc escreveu. Me tocou de uma forma que nem sei descrever. Já rimos juntas muitas vezes ( e põe vezes nisso), já choramos, já dividimos angústias e alegrias...e é isso que chamamos de amizade...Só pode ser, pq se não for, o que vai ser? É sis, como já foi dito por todos, tb chorei. Não é fácil lidar com o finito, com o luto, com o saber que todos nós, um dia, não estaremos mais aqui. Pior que isso, é sabermos que um dia as pessoas que amamos não estarão mais aqui. Ser forte? Por que? Para que? E para quem?? Às vezes precisamos levar uns trancos da vida, para pensarmos como ela está sendo vivida e para que e quem estamos dando valor, não é?
Te amo!

Unknown said...

Patuxa...
Depois disso tudo só uma coisa a dizer: tenho muito orgulho de ser sua amiga!

Não sou de falar muito, mas sei que vc sabe que sempre estarei aqui qdo precisar.

Beijo enoooorme

Ale

Anonymous said...

Dizer o que???
Sem palavras....
Que bom que você consegue passar para o papel o que seu coração fala...
Lá de cima elas estão felizes porque a lição que elas nos passaram realmente você aprendeu de cor..
Parabéns....
Adoro você...
Beijos.
Luciana (Braga)